fotopoesia 01


Esconderijo

Não me agrada a sensação de parecer frágil. Por isso tantas vezes me porto como o colo que consola, a voz que conforta, a mão que afaga. Escuto calmamente cada desabafo que chega a mim, respondo com ou sem meias palavras sempre que convém. Falar ao máximo sobre a dor do outro nada mais é que uma armadura, uma máscara que me protege de falar sobre a minha própria dor, sobre aquilo que me aperta o peito e me faz chorar. Sozinha, no quarto. Eu e meu travesseiro - única testemunha daquilo que eu sinto.
Ser fria, ser aquela que não fala de si, ser aquela que não é inclinada aos sentimentalismos me protege de expor ao mundo o tanto de coisa que bate e machuca aqui dentro.
 Infelizmente, isso é insuficiente quando tendo me esconder de mim mesma.

(re)impresso

arrisco um verso
sem métrica meço
o teto, o regresso
peco

num pudor sem porém
sem feitor, um amor
o jogo entretém
um eu que não sou

Sobre nostalgias e recomeços

Pra ler ouvindo:


Cá estou eu, de novo no mesmo ponto de 4 anos atrás. Será mesmo o mesmo ponto? Será novamente eu, de novo, aquela eu, que há 4 anos arrumava uma mochila com os fones no ouvido sem saber o que esperar do que viria? Será que nesses 48 meses nada de tão enormemente significativo aconteceu?
Que aconteceu, é claro que aconteceu - insiste meu cérebro, numa das muitas broncas destinadas a mim.Seria, no mínimo, muito injusto da minha parte dizer que não - não? Como eu poderia negar todo o amadurecimento e aprendizado que simples fato de eu ter ido morar por outras terras e experimentar de outros goles me trouxe? 
O problema é que a sensação hoje é a mesma. 
É o mesmo sentimento de dar adeus, de deixar pra trás. De ver fotos, encontrar pessoas, ouvir músicas e não conseguir impedir que essa sensação ridiculamente fácil de nostalgia me faça ficar levemente nauseada. 
Tenho gastado mais tempo do que deveria olhando pela minha janela e, nesses momentos, me pego procurando (e encontrando!) detalhes que nunca tinha observado. Tenho lido placas, observado gestos, procurado gostos que nunca - nesses 1461 dias - tinham me despertado atenção suficiente pra que eu guardasse comigo. E o que tenho sido eu, nestes últimos tempos, senão um acumulado enorme de coisas que eu desesperadamente tento levar comigo?

Os sorrisos, os beijos, os cheiros, os gostos. Os meios, os inteiros, os todos, os opostos. Os amargos, os âmagos, os socos. 

Devo admitir, entretanto. Afora essa vontade louca de abraçar o mundo e os fundos com os joelhos (que desde sempre esteve aqui), acho que eu sou mesmo quase outra - quase louca, quase toda, quase nova em um quase tudo. As histórias hoje são outras, muito embora os medos permaneçam quase quase os mesmos.



contragosto

o contrario, o oposto (ao gosto)
me sufoca o rosto
dilacera no outro
um medo quase só
de quase tudo
quase dó
e fá sustenido

um pedaço

de vida, de sangue, de preço
de ser, de querer

querer, não ter
precisar comer
pra quê?

um pedaço de grito,
um tanto contido,
um pouco gemido,
quase nunca ouvido.

um socorro, um silvo
um pedido, eu miro
se cuida, eu me viro
e tá tudo bem.